A reforma do Estado tem sido uma das bandeiras
dos partidos presentes no arco da governação mas também um tema amplamente
discutido na sociedade civil e na comunidade política pela necessidade urgente
de mudança profunda tanto dos órgãos como das suas competências e funções.
Assim, as opiniões divergem entre a diminuição
da intervenção estatal e uma mudança dos paradigmas no funcionamento dos
órgãos, sendo que estas clivagens decorrem claramente das ideologias de cada
partido.
Numa semana de grande agitação face à
apresentação do guião de reforma do Estado, o Partido Socialista fez-se ouvir
através do seu líder, António José Seguro, defendendo o fim de um impasse na
acção governativa e de uma amorfidade do executivo quanto à reforma do Estado, e
afirmando que o guião apresentado por Paulo Portas “é um conjunto de ideias
vazias e em alguns casos contraditórias entre si e contraditórias entre os
ministros”. Desta forma, os socialistas põem a descoberto um certo grau de
falta de orientação por parte do executivo, assim como também uma clara falta
de ideias concretas e de soluções benéficas para o país, para o funcionalismo
público e para o papel que o Estado deve ter.
O Governo foi ainda criticado relativamente à
ausência de propostas concretas e à ausência de uma vontade séria e real de
dialogar e ouvir os partidos da oposição, sendo que o que foi feito até ao
momento são apenas debates sem quaisquer resultados práticos. Tais afirmações
surgiram como resposta ao reparo do Presidente da República que pareceu
criticar os partidos em forma de apelo, para que todos os partidos do arco se
entendessem quanto à reforma do Estado. 1
A crítica quanto às contradições presentes no
documento surge através da conclusão de que existe um hiato entre o que é
defendido publicamente pelo ministro da Saúde, Paulo Macedo, que advoga a não
privatização dos hospitais públicos, e aquilo que está inscrito no guião onde consta
um plano de privatização dos mesmos. 2
Mas críticas aos membros do
executivo não ficaram por aqui e a ministra da Agricultura, Assunção Cristas,
não escapou às mesmas. Os socialistas acusam este ministério de não dar o
exemplo de contenção que impõe a todo o país, visto que consignou um aumento de
12% das suas despesas no Orçamento face ao ano passado, dizendo ainda que este
executivo gasta mais 500 mil euros que o último governo socialista em 2011,
aumentando o número de membros do gabinete. 3
A apresentação do guião para a reforma do
Estado apenas um dia antes do arranque do debate e da votação na generalidade
da proposta do Orçamento, que parece ter sido estrategicamente escolhida pelo
executivo, é apontada pelo partido como uma mera “manobra de diversão” para
desviar atenções dos cortes inscritos no documento financeiro para o ano de
2014, nomeadamente no que concerne à função pública, à redução da despesa,
redução de salários, de pensões, de reformas e de cortes profundos em sectores
essenciais como o da Saúde ou o da Educação. 4
Para além da crítica feita ao Orçamento, o
partido pretende apresentar soluções e novas propostas:
- Uma primeira bandeira remete para a diminuição do IVA, deixada cair pelo Governo depois de este ter deixado a questão em aberto e, pela qual se tem o líder socialista se tem vindo a debater, defendendo um sector importante para um país que ainda consegue tirar bons proveitos da actividade hoteleira. Aqui, o partido defende a redução do IVA em 10 pontos percentuais, perfazendo 13%, acreditando assim contribuir para o aumento da taxa de empregabilidade e para o aumento da competitividade dentro do contexto europeu, principalmente com Espanha.
Quanto ao Orçamento, o partido avançou com poucas
propostas para além das anteriormente apresentadas, focando a sua atenção num
princípio que considera essencial para o bom funcionamento financeiro do Estado
e para o alcance do rigor e da estabilidade orçamental necessária: a
neutralidade orçamental.
Assim, segue os mesmos critérios utilizados para os
orçamentos de 2012 e 2013, advogando que para cada aumento da despesa terá de
haver um aumento da receita ou diminuição da despesa feito de forma
proporcional.
- Já a segunda remete para o aumento do salário mínimo que resultará na melhoria das condições de vida da população e no aumento do poder de compra e consequente fomento da economia interna. São então estes os pontos principais a implementar pelos quais Seguro e o PS se debaterão nas discussões sobre o OE. 5
O PS rejeitou o primeiro documento apresentado pelo
executivo: o guião da reforma do Estado dado a conhecer por Paulo Portas onde é
defendido um modelo social e de estruturação do Estado aproximado ao modelo
europeu, com todas as implicações económicas que dele possam resultar, assim
como também é defendida uma ampla reforma do Estado.
O Partido Socialista deve ter especial cuidado nos tempos
que se avizinham de forma a não ser criticado pelos mesmos erros com que
criticou o executivo, principalmente no que concerne à falta de diálogo e de
vontade de chegar a um consenso acima de quaisquer quezílias interpartidárias
que beneficie realmente a Nação.
O PS atravessa então um período que requer grande cautela
na aproximação e discussão destas temáticas pelas repercussões que muito provavelmente
poderão advir, visto que este é o principal partido da oposição e que, segundo
estatísticas recentes, o apontam como o partido que deverá vencer as próximas
eleições. Isto porque, caso ganhe as próximas eleições legislativas marcadas
para 2015, não poderá de forma alguma ser acusado de ter deitado por terra o “árduo
esforço” de ajustamento financeiro levado a cabo pelo anterior governo.
O PS tem de ser alinhar no espectro político enquanto um
partido responsável que não perde tempo com “birras”, tendo como prioridade a
eliminação das divergências e das dificuldades que possam surgir em âmbito de
debate, o que também lhe será muito proveitoso para captar mais votos numa altura
em que o executivo actual se encontra moribundo e sem grande capacidade de
acção mas apenas de reacção a eventuais ataques que lhe possam ser disferidos.
Quanto a este assunto, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou na
sua rubrica semanal que o grande trunfo do partido será o de saber mexer-se na
arena política nos moldes acima citados e no talento em conseguir ganhar as
próximas eleições e em conseguir que “Portugal tenha um programa cautelar”. 6
Os socialistas defenderam ainda que os portugueses estão a
ser enganados face aos números do défice apresentados, dizendo o executivo que
este o número pretendido será alcançado, ao passo que a própria Comissão
Europeia afirma que existirá um desvio de meio ponto percentual. Assim, o PS
acaba por inviabilizar os argumentos referentes ao necessário sacrifício
económico dizendo que as actuais medidas não obtêm os resultados esperados e
que Portugal vive há já 3 anos uma “dor sem ajustamento”. 7
Por último, avisam ainda que a proclamada descida da taxa
de desemprego é explicada pelo simples facto de ter havido uma diminuição da
população activa, da emigração e do desespero e falta de esperança da população
que já não procura emprego. 8
Posto isso,
e com a percepção da existência de poucas propostas e de muitas críticas do grande
grupo opositor ao Governo conclui-se que tanto o Partido Socialista como
António José Seguro devem ter especial cuidado para não passarem a mensagem de
um partido que, enquanto oposição, deveria fortalecer-se, ser proactivo e
demonstrar novos rumos num contexto tão difícil como aquele que o país
atravessa.
Joana Lemos
Bibliografia:
1 Cavaleiro, Diogo, Seguro responde a pedido de Cavaco para mais
diálogo entre partidos: “Chega de conversas”, in Jornal de Negócios, www.jornaldenegocios.pt, consultado a 6
Novembro 2013, pelas 19:30 (http://www.jornaldenegocios.pt/economia/detalhe/chega_de_conversas_e_como_seguro_responde_a_pedido_de_cavaco_para_mais_dialogo_entre_partidos.html)
2 Reforma do Estado: “Chega de conversa fiada”, diz Seguro
in Noticias
TVI24, www.tvi24.iol.pt,
consultado a 6 Novembro 2013 pelas 19:57 (http://www.tvi24.iol.pt/503/politica/seguro-antonio-jose-seguro-guiao-reforma-estado-governo/1506709-4072.html)
3 Lusa, PS acusa
ministra da Agricultura de ser despesista, in RTP Notícias, www.rtp.pt, consultado a 6 Novembro 2013 pelas
20:12 (http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=693661&tm=9&layout=121&visual=49)
4 Rego, Ricardo, Seguro
rejeita revisão constitucional, in Jornal Sol, www.sol.sapo.pt, consultado a 6 Novembro
2013, pelas 20:26 (http://sol.sapo.pt/inicio/Politica/Interior.aspx?content_id=89488)
5 Henriques, António, Seguro faz do IVA na restauração e do aumento do salário mínimo duas
bandeiras, in PTJornal, www.ptjornal.com,
consultado a 6 Novembro 2013, pelas 21:32 (http://www.ptjornal.com/2013110619096/geral/politica/seguro-faz-do-iva-na-restauracao-e-do-aumento-do-salario-minimo-duas-bandeiras.html)
6 Antunes, Sara, Marcelo
Rebelo de Sousa: está nas mãos de Seguro não só o seu destino como o do país
nos próximos anos, in Jornal de Negócios, www.jornaldenegocios.pt, consultado a 6
Novembro 2013, pelas 21:45 (http://www.jornaldenegocios.pt/economia/detalhe/marcelo_rebelo_de_sousa_esta_nas_maos_de_seguro_nao_so_o_seu_destino_como_o_do_pais_nos_proximos_anos.html)
7 Cavaleiro, Diogo, PS
sublinha alerta da Comissão Europeia para novos riscos associados a nova
austeridade, in Jornal de Negócios, www.jornaldenegocios.pt,
consultado a 6 Novembro 2013, pelas 21:57 (http://www.jornaldenegocios.pt/economia/detalhe/ps_sublinha_alerta_da_comissao_europeia_para_novos_riscos_associados_a_nova_austeridade.html)
8 Lusa, PS rejeita tentativas
de identificar riscos nas decisões do Constitucional, in Noticias ao
Minuto, www.noticiasaominuto.com,
consultado a 6 Novembro 2013, pelas 22:10 (http://www.noticiasaominuto.com/economia/126711/ps-rejeita-tentativas-de-identificar-riscos-nas-decisoes-do-constitucional#.UnopxX_3yW8)
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