Em ciência
política, por abstenção entende-se uma forma de participação passiva e o acto
de negação na tomada de decisões políticas, nomeadamente ao nível das eleições.
Em democracia, existem duas formas de manifestar este tipo de abstenção:
presencial e não- presencial. No primeiro caso, o eleitor ausenta-se do
exercício do voto. No segundo caso, o eleitor vota como forma de expressão para
a sua atitude abstencionista, através dos tão conhecidos votos nulo ou em
branco. Para justificar esta acção, Arend Lijphart afirmara
outrora que "a abstenção é um fenómeno muito importante porque representa
uma forma funcional de desigualdade política e, participação desigual significa
influência desigual, na medida em que acarreta importantes consequências para
quem é eleito e para o conteúdo das políticas públicas."
Quanto à
sua dimensão, esta pode ser explicada pelo distanciamento, descontentamento ou
falta de esperança nos partidos candidatos. No entanto, para além da
importância daqueles que votaram e/ou ganharam as eleições, é importante
reflectir igualmente sobre quem não vota, o aumento generalizado dos movimentos
independentes, a generalizada apatia cívica ou as sucessivas formas de protesto
contra o governo.
Enquanto para
António Costa, o aumento dos votos nulos ou em branco são motivos de reflexão
uma vez que “alguém que vence o incómodo da comunidade estar em casa, sai à rua
e vai à urna para dizer algo é muito significativo. Significa que, de facto, há
aqui um espaço de alternativas que ainda está por mobilizar”; para Cláudia
Madeira, apesar da taxa de abstenção elevada, a Coligação Democrática Unitária
viu uma consolidação do seu reforço.
Sobre eventuais votos na CDU de cidadãos que não costumam votar quer no
PCP quer no PEV, Jerónimo de Sousa sublinhou o "reconhecimento" pela
actuação da coligação a nível local. Após este seu discurso na Assembleia da
República, Pedro Passos Coelho riposta ao secretário-geral do Partido Comunista
Português e afirma que “as eleições locais foram eleições locais e o partido
comunista, apesar do bom resultado eleitoral, talvez devesse ser um pouco mais
modesto quando fala do grande milagre das eleições autárquicas. O senhor
deputado, em termos de avaliação, suporte político medido em número de câmaras
municipais continuará a não ter o apoio da generalidade dos portugueses”. Em
resposta a esta provocação do primeiro-ministro social democrata, Jerónimo de
Sousa volta a declarar a CDU como a
única força política "a crescer em votos, percentagem, maiorias e
mandatos" nas eleições autárquicas de domingo.
Já no dia seguinte, 2 de Outubro, Heloísa Apolónia faz nova declaração
política sobre o resultado das eleições autárquicas, ao afirmar que Passos
Coelho retirou as conclusões erradas destas eleições e que está totalmente
divorciado das necessidades dos portugueses. Declara também que “a
confiança que foi traduzida à CDU nestas eleições autárquicas acrescenta-nos
certamente responsabilidades quer ao nível local quer ao nível nacional”.
Para o PEV
e, especialmente em relação ao Partido Socialista, é importante ter atenção à
redução de 1 ou 2 pontos percentuais em relação às ultimas eleições. Para ‘Os
Verdes’, esta redução deve-se ao distanciamento dos eleitores relativamente ao
percurso governativo enquanto foi governo e também em relação ao papel que tem
tido enquanto suposta oposição. Para além disso, importa ainda não esquecer o Memorando
de Entendimento da Troika que marca presença assídua desde 17 de Maio de 2011,
data em que foi assinado. 800 mil consagra o total de votos que foram
distribuídos (ou não) pelos partidos que assinaram e apoiaram a assistência externa
económica e financeira que estreita e reforça relações com a Comissão Europeia,
o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional.
Pedro
Ventura considera ainda outra situação dúbia e relevante em relação aos reais
números da abstenção. Durante a campanha autárquica, os eleitores fantasma
foram um tema constante mas a abstenção real passa igualmente pela eliminação
dos 700 mil emigrantes. Numa tradução em percentagens, a real abstenção
equivale a um total de 38% contra a média de 32% na União Europeia. Assim, para
a CDU (PCP e PEV), estas percentagens não são ‘100% confiáveis’.
É também neste
sentido que este candidato pela CDU à câmara de Sintra decide trazer dados
concretos para o debate. Na análise numérica que fez sobre o concelho a que foi
candidato, por cada dez eleitores, apenas quatro votaram nestas eleições.
Confirma ainda que o PSD e o CDS perderam, juntos, cerca de 72% da massa
eleitoral (45000 votos) mas que estes números não foram capitalizados pelos
movimentos independentes, considerando necessário perceber para onde é que
estes votos vão, perceber o motivo pelo qual as pessoas estão descontentes e
revelam um maior afastamento. Para além disso, são os próprios movimentos
independentes que entram numa dinâmica anti-partidos. Esta é uma dinâmica
perigosa para a democracia tendo em conta que a mesma não exclui representações
de outras entidades quer de cariz existencial quer de corporativismo social
como os movimentos de cidadãos (centrais sindicais, maçonaria, etc) mas
funda-se nos partidos.
Esta é a marca principal do desafio contra o órgão de
soberania tecnocrata. Apesar de serem eleiçoes de freguesia e de entidade
local, não deixa de existir uma centralização através dos partidos que pode
levar, por conseguinte, a uma desfragmentação identitária uma vez que antes da
existência das freguesias, foi fundado o Estado. E a democracia tem de se habituar a este tipo
de cidadania. Mas a partidocracia é mais forte. Joga com a nossa própria existência não só social mas
política.
Noticiários
diários, nomeadamente o Jornal Nacional da SIC, da TVI e RTP Informações.
https://www.facebook.com/permalink.php?story_fbid=637728619583981&id=190235157666665 (visitado às 19h30 do dia 7 de Outubro)
https://www.facebook.com/permalink.php?story_fbid=638289539527889&id=190235157666665(visitado às 19h42 do dia 7 de Outubro)
https://www.facebook.com/permalink.php?story_fbid=637834159573427&id=190235157666665(visitado às 19h50 do dia 7 de Outubro)
http://tretas.org/AnaliseAbstencao
Lijphart, Arendt, Modelos de Democracia (tradução de Roberto Franco)
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
Lijphart, Arendt, As Democracias Contemporâneas
(tradução de Alexandre Correira e Francisca Bagio) Lisboa: Gradiva, 1989.
Adriana Correia
212290
212290
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.