A evolução
da abstenção nas eleições para as autarquias locais.
ANO
|
Taxa de Abstenção - %
|
Total de votantes
Indivíduos
|
Votantes
Indivíduos
|
Abstenção
Indivíduos
|
1976
|
35,4
|
6.460.528
|
4.170.494
|
2.290.034
|
1979
|
26,2
|
6.7617.51
|
4.987.734
|
1.774.017
|
1982
|
28,6
|
7.185.284
|
5.131.483
|
2.053.801
|
1985
|
36,1
|
7.593.968
|
4.852.563
|
2.741.405
|
1989
|
39,1
|
8.121.045
|
4.946.196
|
3.174.849
|
1993
|
36,6
|
8.530.297
|
5.408.119
|
3.122.178
|
1997
|
39,9
|
8.922.182
|
5.362.609
|
3.559.573
|
2001
|
39,9
|
8.738.906
|
5.254.180
|
3.484.726
|
2005
|
39,0
|
8.840.223
|
5.390.571
|
3.449.652
|
2009
|
41,0
|
9.377.343
|
5.533.824
|
3.843.519
|
2013
|
47,4
|
9.497.303
|
4.995.174
|
4.502.129
|
Ainda
não tinham sido apurados os resultados totais das eleições autárquicas do
passado dia 29 de Setembro e praticamente todos os principais órgãos de
comunicação social anunciavam o ‘vencedor’ da noite eleitoral, ou seja, a
abstenção.
As eleições
de domingo registaram uma taxa de abstenção de 47,4%, a mais alta de sempre em
autárquicas, confirmando uma tendência crescente desde o escrutínio autárquico
de 1982. De
acordo com os dados oficiais publicados na página oficial da Direção Geral de
Administração Interna, 47,4 por cento dos 9.492.396 eleitores inscritos optaram
por não exercer o direito de voto nas autárquicas de domingo. Foram às urnas
4.992.490 eleitores. A abstenção foi, assim a grande «vencedora» das eleições.[2]
Sobre as razões que poderão justificar esta taxa de
abstenção, de vária ordem e seguramente de natureza complexa, enfatizamos as
declarações do presidente da Comissão Nacional de Eleições quando refere que na
origem destes resultados estão fatores como a «reorganização das freguesias, um excesso
de candidaturas e até o mau tempo»[3].
Parece-nos, em parte, justificações no mínimo discutíveis e, em alguma medida simplistas
e levianas. Não se refere uma única vez por exemplo, a teoria do protesto que muitos especialistas referem como uma das
possíveis fundamentações para a taxa de abstenção observada, associada a um
profundo descontentamento dos eleitores portugueses com os partidos políticos e
os políticos no abstrato.
Contudo, passando do abstrato ao concreto, só três partidos,
dos seis atualmente relevantes no universo político-partidário português, assumiram
funções de governação desde 1976. Com alguma evidência, se percebe o porquê do
PS, PSD e CDS-PP terem perdido mais de 800 mil votos nestas últimas eleições[4].
Sozinhos ou coligados, o triunvirato português do ‘arco do poder’ tem,
supostamente para todos os que não votaram nos partidos supramencionados,
votando noutros ou abstendo-se, profundas responsabilidades no estado económico
e social em que se encontra o país e daí a sua penalização eleitoral, sempre
relativa é certo.
Por outro lado, a atual realidade sociológica que se
verifica no nosso país terá seguramente algum tipo de influência na falta de
participação política, no caso concreto no não
exercício do direito ao voto de milhões de portugueses. Refere André Freire num
estudo publicado no ano de 2000 que «a desintegração socioprofissional dos
desempregados explicará a sua menor participação eleitoral»[5].
Ora, é do conhecimento público a elevada taxa de
desemprego que hoje se verifica em Portugal, aliás, matéria que a CGTP-IN tão
duramente tem denunciado como uma das consequências da política do Governo. O
Secretário-Geral da central sindical, num encontro em Coimbra, «colocou em causa as novas
estimativas do Governo (…) que apontam para uma taxa de desemprego no próximo
ano de 17,7%, quando eram de que chegasse aos 18,5%.»[6]
Estes dados referem-se a estimativas da taxa oficial do desemprego contudo, a
taxa real ultrapassa em grande medida estes números. «No fim do ano de
2013, o desemprego oficial atingirá 1.040.800 portugueses, e o desemprego real,
calculado com base em dados do INE, deverá atingir 1.641.000 portugueses.»[7]
Falamos portanto de cerca de 25% da população ativa
sem emprego. Se se perspetiva o aumento do desemprego para 2014, não é difícil
adivinhar o crescimento da insatisfação e frustração de milhões de portugueses,
alimentando simultaneamente, um determinado sentimento de descrédito face à
‘política e aos políticos’. Será assim expectável, o aumento da alienação no
que diz respeito à sua participação politica que, obviamente, não se reduz
apenas à questão de se absterem no ato de votar, mas tem neste comportamento,
mínimo no que concerne aos conceitos de participação politica e de cidadania,
um sinal evidente e preocupante da realidade politica portuguesa.
A CGTP-IN não se prenunciou explicitamente sobre a
elevada abstenção nestas últimas eleições, todavia, nas conclusões da reunião
da Comissão Executiva pode ler-se que as «eleições autárquicas traduziram-se numa derrota estrondosa do
Governo do PSD-CDS, com a
consequente erosão acelerada da sua base social de apoio. A votação, no plano
nacional, constitui um sinal claro de condenação do Governo e da política de
direita e uma exigência de mudança, indissociável da sua demissão e da
convocação de eleições antecipadas. (…) O Presidente da República tem de ver,
ouvir e agir!»[8]
Podemos igualmente salientar as declarações de
Arménio Carlos quando critica a cumplicidade entre o Governo e Cavaco Silva, concretamente
sobre a existência de «uma visão,
do Presidente da República e do Governo, que continua numa perspetiva de
aproveitar esta oportunidade para fazer um acerto de contas com abril,
nomeadamente com as conquistas e direitos dos trabalhadores que resultaram da
revolução de Abril (…).»[9]
Não temos dúvidas que na origem das crescentes taxas
de abstenção verificadas em Portugal residem justificações que atravessam o
campo sociológico, cultural, político e económico. Contudo, uma das informações
vinculadas na comunicação social, que poderá em alguma medida desdramatizar a
problemática da abstenção, faz referência à velha temática dos ‘eleitores
fantasma’.[10] No caso
de se confirmar a existência de cerca de 900 mil a um milhão de indivíduos
considerados irreais nos cadernos eleitorais por razões várias, diminui consideravelmente
a base numérica da população em condições de votar e a taxa de abstenção
diminuirá igual e consequentemente.
Uma dos motivos apresentados no estudo dos dois investigadores do
Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, que deu origem
aos números atrás referidos de eleitores-fantasma, aponta a emigração como
fator influente nessas conclusões. Aliás, o fenómeno da emigração é, para a
CGTP-IN uma outra consequência da política desastrosa levada a cabo por este
governo.
A central sindical afirmava em agosto último como
extremamente preocupante o facto de terem «saído do país cerca de 142 mil jovens com idade compreendida entre os 15
e os 34 anos, o que significa uma diminuição da população ativa jovem superior
a 7% – sendo que a emigração maciça de jovens, a maioria qualificados, terá
consequências profundas e gravosas a médio/longo prazo.»[11]
Através do
Observatório da Emigração, podemos reforçar a ideia de uma crescente saída de
portugueses do território nacional, quando este organismo aponta para 1,5 milhões de portugueses emigrados em países da
OCDE, dez por cento dos quais têm educação superior.[12]
Estruturalmente, podemos analisar um outro problema,
que não aprofundaremos nesta síntese reflexiva pelas suas implicações de
natureza bastante complexa, mas que também se podem associar aos elevados
níveis de abstenção. Referimo-nos à falta de legitimidade do sistema político
português e, implicitamente, do atual Governo em continuar as suas funções.
Alertava Adriano Moreira em Janeiro deste ano, que «este governo está a enfraquecer a
legitimidade de exercício, porque os programas eleitorais eram bem diferentes
do exercício.»[13]
A CGTP-IN há muito que denuncia a falta de legitimidade do governo,
em alguma medida, apresentando os mesmos argumentos, reforçados a ampliados
face às várias decisões do Tribunal Constitucional (TC). «O líder da CGTP considera que, com esta decisão [do
TC], “o Governo perdeu a legitimidade política, ética e moral para continuar” e
sublinhou que “o Presidente da República não agiu com a responsabilidade
adequada porque deveria ter pedido a fiscalização preventiva” do OE.»[14]
Será que a abstenção observada no passado dia 29 de
Setembro, reflexo de um certo alheamento progressivo dos portugueses reforça,
ou será indiferente no contexto da legitimidade do sistema e da ação
governativa em concreto face ao momento atual que atravessamos?
Luís Dias
7
de Outubro de 2013
[1] Pordata
– Base de Dados Portugal Contemporâneo, Eleitores
nas eleições para as autarquias locais: total, votantes e abstenção, última
atualização a 1 de Outubro de 2013. Disponível em http://www.pordata.pt/Portugal/Eleitores+nas+eleicoes+para+as+Autarquias+Locais+total++votantes+e+abstencao-2190
[acedido a 7 de Outubro às 08h46]
[2] TVI 24, Autárquicas: a mais alta taxa de abstenção
de sempre, artigo publicado na página da internet da TVI24 a 30 de
Setembro. Disponível em http://www.tvi24.iol.pt/503/politica/autarquicas-autarquicas-2013-resultados-finais-direcao-geral-da-administracao-interna-abstencao-tvi24/1494798-4072.html
[acedido a 7 de Outubro, às 08h17]
[3] Guedes,
Nuno, CNE desdramatiza elevada abstenção
nas autárquicas, artigo publicado na página da internet da Rádio TSF a 4 de
Outubro de 2013. Disponível em http://www.tsf.pt/PaginaInicial/Portugal/Interior.aspx?content_id=3458178
[acedido a 7 de Outubro, às 09h16]
[4]
ECONÒMICO, PS, PSD e CDS-PP perderam
mais de 800 mil votos, artigo publicado na página eletrónica do Jornal
Económico a 2 de Outubro de 2013. Disponível em http://economico.sapo.pt/noticias/ps-psd-e-cdspp-perderam-mais-de-800-mil-votos_178482.html
[acedido a 7 de Outubro, às 17h11]
[5] Freire,
André, Participação e abstenção nas
eleições legislativas portuguesas, 1975-1995, 2000, p.119. Disponível em http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1218810209V8fJM3lx2Tt44TQ0.pdf
[acedido a 7 de Outubro, às 09h56]
[6] Fonseca,
Sofia, CGTP não acredita que crescimento
previsto crie emprego, artigo publicado na página da internet do Jornal DN Economia a 4 de Outubro de
2013. Disponível em http://www.dn.pt/inicio/economia/interior.aspx?content_id=3459747
[acedido a 7 de Outubro, às 10h34]
[7] Rosa,
Eugénio, Descalabro Economico e Social
em Portugal: a consequência de uma política recessiva que desde o inicio já se
sabia que ia ter estes resultados, 18 de Março de 2013. Disponível em http://www.eugeniorosa.com/Sites/eugeniorosa.com/Documentos/2013/11-2013-Descalabro-economico-social.pdf
[acedido a 7 de Outubro, às 10h58]
[8]
CGTP-IN, CONCLUSÕES DA REUNIÃO DA COMISSÃO EXECUTIVA DA CGTP-IN (30 SET
2013), OFÍCIO CIRCULAR N.º 235/13 A.COORD/NR/Lisboa,
01-10-2013
[9] Diário
Digital, CGTP diz que Cavaco está
distanciado da realidade do país, artigo publicado na página da internet do
Diário Digital a 3 de Outubro de 2013. Disponível em http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=659995
[acedido a 7 de Outubro, às 11h23]
[10]
Monteiro, Manuel, Eleitores-fantasma: a
realidade que não mudou, artigo publicado na página eletrónica do Jornal i, a 11 de Setembro de 2013.
Disponível em http://www.ionline.pt/iopiniao/eleitores-fantasma-realidade-nao-mudou
[acedido a 7 de Outubro, às 11h47]
[11]
CGTP-IN, Números do desemprego não mostram reversão da
grave situação económica e social do país, Comunicado de Imprensa
n.º 051/13 publicado na página oficial da internet da CGTP-IN a 7 de Agosto de
2013. Disponível em http://www.cgtp.pt/comunicacao/comunicados/6626-numeros-do-desemprego-nao-mostram-reversao-da-grave-situacao-economica-e-social-do-pais
[acedido a 7 de Outubro, às 12h26]
[12]
Observatório da Emigração, Portugal é
dos países da OCDE com mais emigrantes, artigo publicado a 1 de Outubro de
2013 na página oficial da internet do Observatório da Emigração. Disponível em http://www.observatorioemigracao.secomunidades.pt/np4/3722.html
[acedido a 7 de Outubro, às 12h34]
[13]
Henriques, Sandra, Adriano Moreira
alerta governo que legitimidade de exercício é cada vez menor, artigo
publicado na página da internet da RTP Noticias a 11 de Janeiro de 2013.
Disponível em http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=618599&tm=9&layout=123&visual=61
[acedido a 7 de Outubro, às 17h45]
[14]
Correia, Raquel Almeida, Arménio Carlos
considera que “Governo perdeu legitimidade para continuar”, artigo
publicado na página oficial da internet do Jornal O Público a 5 de Abril de
2013. Disponível em http://www.publico.pt/economia/noticia/armenio-carlos-considera-que-governo-perdeu-legitimidade-para-continuar-1590319
[acedido a 7 de Outubro, às 18h34]
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